A imensa alegria que sinto depois do resultado desta noite consegue ser ainda ampliada pelo sentimento de justiça que a nossa vitória folgada me dá. O jogo nem sequer foi tão desequilibrado quanto o resultado final poderá fazer crer, mas derrotar sem apelo nem agravo aqueles tipos tem o sabor de uma vitória do Bem sobre o Mal. Depois das notícias sobre o comportamento daquela corja de associados do nosso adversário, habituados à total impunidade dentro do seu pequeno feudo, e que se dedicam alegremente a espalhar euforicamente o terror e a violência gratuita sempre que de lá saem, seria de uma justiça atroz que esses indivíduos ainda fossem recompensados com uma viagem de regresso na satisfação de uma vitória. Nem foi preciso apresentarmos a equipa titular, nem o auxílio despudorado prestado pelo bandido do Jorge Sousa os ajudou, nem sequer foi necessário estarmos ao nível que tem sido habitual esta época e darmos espectáculo: três a zero, assunto arrumado, e mais um troféu nas nossas vitrinas.
Sim, do outro lado estava o fóculporto, mas se poupando meia equipa deu para espetar quatro na lagartagem, o fóculporto não é mais do que eles (e já o demonstraram claramente), e por isso mesmo Cardozo, Saviola, Javi García e Ramires começaram o jogo no banco. Alan Kardec, Carlos Martins (subindo o Aimar para segundo avançado), Airton e Rúben Amorim fizeram as vezes deles, e não nos deixaram ficar com saudades dos habituais titulares. Devido ao adiantamento do Aimar, jogámos de uma forma algo diferente, deixando o Kardec um pouco mais isolado na frente, com o Aimar a ter tendência para vir ajudar mais na luta do meio campo - provavelmente a intenção seria até que ele fosse uma espécie de Saviola mas, como tantas vezes aconteceu o ano passado sob a orientação do Quique, quando o Aimar se adiantava um pouco mais desaparecia praticamente do jogo, e por isso ele acabava por recuar à procura da bola. Do lado dos nossos adversários, nada de novo, já que a táctica é quase sempre a mesma desde que o Tio JuJu é treinador deles, e portanto meteram o Belluschi na direita para poderem jogar no habitual 4-3-3.
O jogo iniciou-se numa tomada equilibrada, com o Benfica a parecer até deixar que o fóculporto tivesse mais posse de bola do que é habitual permitirmos ao adversário nos nossos jogos. Os andrades até deram o primeiro sinal de perigo, quando o Quim foi obrigado a aplicar-se aos oito minutos para parar um remate de primeira da Meretriz Uruguaia, ainda de fora da área. Praticamente na resposta, um sinal claro de que a noite seria nossa, pois chegámos ao golo numa falha incrível do guarda-redes andrade. O Rúben Amorim fez um remate, rasteiro e sem muita força, ainda a uma boa distância da baliza, e a aselhice do guarda-redes fez o resto, permitindo que a bola lhe batesse nas mãos e escapasse para dentro da baliza. O fóculporto tentou responder ao golo, e teve o seu melhor período durante cerca de quinze a vinte minutos (o que nem assim quer dizer que tenha sido melhor no jogo), com o Benfica a passar mais tempo remetido ao seu meio campo e o nosso adversário a dispor de mais posse de bola, mas sem que a nossa baliza passasse por muitos momentos complicados.
Quando nos aproximámos do intervalo, o Benfica reequilibrou as coisas, e começou a chegar novamente perto da baliza adversária. E mesmo sobre o intervalo, numa raríssima ocasião em que o Jorge Sousa lá resolveu apitar uma falta a nosso favor, dispusemos de um livre a uns bons trinta metros da baliza do fóculporto. Chamado a marcá-lo, o Carlos Martins atirou uma bomba irrepreensível que resultou num golão. Dois a zero, e nem sequer tinha sido preciso correr muito. Por esta altura o Bruto Alves, que já andava irritadiço e a ceifar e massacrar tudo o que fosse vermelho e lhe passasse ao alcance dos pitons ou cotovelos (perante a complacência e olhar enternecido do compincha Jorge) perdeu a tramontana e partiu para a agressão pura e simples. Quem levou com ele foi o Aimar e o Jorginho, salomónico, deu um amarelo ao Bruto Alves e outro ao Aimar. Ainda esboçou o gesto para dar um beijinho ao Brutinho Alves, mas depois arrependeu-se e lá o deixou ir para os balneários enquanto espumava e escoiceava.
A segunda parte ficou marcada por dois aspectos: o controlo, sem grandes dificuldades, da vantagem no marcador por parte do Benfica, e o show de esquizofrenia particular do Jorge Sousa, a permitir que os carniceiros do seu amado clube permanecessem em campo durante os noventa minutos, mesmo que acotovelassem, pontapeassem ou pisassem os jogadores do Benfica - Bruto Alves (claro...) e Meireles em particular - mas revelando-se ao mesmo tempo um feroz aplicador das leis de futebol e da disciplina sobre os jogadores do Benfica, tendo os sarrafeiros Coentrão e Ramires (à primeira falta que fez, sem qualquer violência e no círculo central) sido admoestados por este justiceiro do apito.
Quanto ao jogo em si, foi como disse: o Benfica controlou e geriu o resultado sem grandes dificuldades. Subimos um pouco mais as linhas, empurrámos o fóculporto mais para o seu meio campo, e eles não revelaram capacidade para ripostar. As alterações feitas pelo Tio JuJu não ajudaram em nada, o fóculporto não conseguia criar oportunidades, e à medida que o tempo passava não fazia muito mais do que chutar bolas para a frente. Não me recordo de uma defesa do Quim digna desse nome. O Benfica também não criou grandes oportunidades nesta segunda parte - a excepção foi um lance individual do David Luiz - mas à medida que se iam abrindo espaços nas costas da defesa adversária, e com as presenças do Ramires, Saviola, e Cardozo em campo, ficávamos com a sensação de que poderíamos voltar a marcar. O que aconteceu, mesmo no final do jogo para fechar com chave de ouro: combinação entre o Saviola e o Rúben Amorim, com este a ficar isolado sobre a direita e a picar a bola sobre o frangueiro adversário. Esta foi ainda desviada por um defesa contra o poste, e o Cardozo na recarga fez um golo fácil, para que o jogo acabasse em apoteose.
Melhor em campo? Para mim, Rúben Amorim. Ele tem, aliás, andado num excelente momento de forma nas últimas semanas, e hoje foi apenas mais um jogo a confirmá-lo. E o que é ainda mais impressionante é que ele tem jogado bem a lateral direito, a médio direito, a médio centro, ou a trinco. Ponham-no nas funções que quiserem, e o Rúben cumpre com distinção. É um luxo podermos ter um jogador (e benfiquista, ainda por cima) destes no plantel. Só o Queirósz é que não consegue ver nada disto, das cadeiras onde se gosta de sentar ao lado do Mestre Pinto ou do Cabeça de Cotonete. É mais valiosa a esperteza da Micaela (grande jogo hoje... não sei com quantos dedos lhe tocaram na cara, mas espero que alguém lhe tenha metido três dedos bem espetadinhos à frente do focinho), por exemplo. Outro grande jogo foi também o do Fábio Coentrão. De jogo para jogo vai mostrando estar a fazer-se um defesa lateral muito bom. Não sei se terá perdido algum duelo individual. Mais outra demonstração de grande valor também do Airton, que hoje completou os noventa minutos. O Javi García é um jogador fundamental, mas se por acaso nos faltar, não será por ali que a equipa tremerá. Posso também mencionar o jogo quase perfeito da nossa dupla de centrais (sem precisarem de morder, escarrar, acotovelar, pontapear ou pisar adversários), mas já é quase um hábito eles jogarem bem. E falta ainda mencionar o Carlos Martins, que tem vindo a ganhar importância na equipa e que foi hoje decisivo, com um golo fantástico.
O que mais me agrada é ver a cultura de vitória instalar-se na nossa equipa. Nem foi necessário fazer uma exibição de encher o olho para que uma vitória tranquila sobre o fóculporto surgisse com toda a naturalidade. A união e a vontade de vencer desta equipa dão gosto ver, e enchem os adeptos de confiança. Nós, benfiquistas, temos uma crença quase ilimitada na nossa equipa, mas incrivelmente, por vezes fico com a sensação de que eles ainda conseguem acreditar mais neles próprios do que nós acreditamos neles.
A primeira sobremesa já está no papo. Agora, voltemos novamente as nossas atenções para o prato principal desta época.
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