Chegados aqui, a pouco mais de vinte dias do final da época, vivemos todos – adeptos, atletas, dirigentes – a ansiedade de saber, antecipar, adivinhar o futuro, o Destino.
Mas, ao contrário da “Anankê” grega, este é um Destino sobre o qual pode agir a condição humana. Escrevo este texto quando faltam dois jogos para atingir uma final europeia e três jogos para um título europeu. Três jogos para poder inscrever o nome na História, três jogos para que cada atleta, cada adepto, cada um dos que vive o Benfica possa inscrever o nome no tempo e, desta forma, transcenda a condição humana e se eleve à condição de herói.
A condição de herói não se consegue sem sofrimento. O saber latino ensinou-nos que “ad augusta per angusta”. Ou seja, alcança-se a glória através das provações. Pessoa dizia que “Quem quer passar além do Bojador / Tem que passar além da dor”. Também nós, benfiquistas, sabemos que o sofrimento está na antecâmara da glória. Na nossa História nada nos foi dado, nada nos foi facilitado e tudo o que conseguimos teve de ser conquistado com sacrifícios. Numa época em que se recordam, celebram e homenageiam os primeiros benfiquistas que conquistaram a Europa, tenhamos nos exemplos dos que eram liderados por Coluna e Águas a inspiração para perceber que a diferença entre a memória e o esquecimento está na capacidade de superarmos as nossas fraquezas. Ser Benfica é também isto. Exige o tempo presente que o saibamos ser de forma exemplar.
Escrevo este texto antes do primeiro jogo da meia-final da Liga Europa. Escrevo-o com a confiança de que todos os que são Benfica sabem o caminho para agir sobre o Destino. Sei que há que chorar juntos para podermos conquistar juntos. Esta época já chorámos. Agora chegou o momento de conquistar!
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Artigo de opinião publicado também na edição de 29/04/2011 do jornal "O Benfica".
[Se alguém quiser manifestar-me a sua opinião, pode fazê-lo para este endereço: tertuliabenfiquista@gmail.com]
Esta noite demos um passo em direcção à final de Dublin. Só foi pena ter sido apenas um pequeno passo, porque mesmo com a equipa inferiorizada por ausências, julgo que o Benfica mostrou superioridade em relação ao Braga, e poderia ter construído outro resultado que nos desse mais tranquilidade para a segunda mão.
Sem grandes opções devido às lesões e indisponibilidades físicas, o Benfica acabou por alinhar com o onze mais ou menos esperado, em que o trio do meio campo à frente do Javi foi constituído pelo Aimar, Martins e Peixoto. Na defesa o Jardel manteve a titularidade, e na baliza regressou o Roberto, com o resto da equipa a ser constituída pelos titulares habituais. O Braga veio à Luz para fazer aquilo que tem feito habitualmente e com eficácia nesta competição: defender, e espreitar eventualmente um golo nalguma jogada fortuita. Foi por isso com naturalidade que o Benfica assumiu a iniciativa do jogo desde o primeiro minuto, e isto no sentido literal do termo, já que com vinte segundos de jogo foi apenas por falta de jeito do Saviola para controlar uma bola vinda de um mau passe de um defesa do Braga que não criámos uma grande ocasião de golo. A resposta do braga foi dada um par de minutos depois, através de um bom remato do Sílvio. E esse acabou por ser o único remate do Braga em toda a primeira parte, o que pode exemplificar a atitude com que entraram na Luz. O Benfica continuou a ter o domínio do jogo, até porque o Braga não parecia ter grandes problemas em deixar que o Benfica o tivesse, e até chegou a marcar um golo aos dez minutos, mas este foi bem anulado por fora-de-jogo ao Cardozo. Nunca conseguimos propriamente sufocar o Braga, mas ainda assim conseguimos criar oportunidades de golo que justificariam termos chegado ao intervalo em vantagem. A melhor de todas foi mesmo no final da primeira parte, quando o Cardozo, após isolado por um passe do Saviola para as costas da defesa, tentou desviar tanto a bola do guarda-redes que acertou no poste.
A segunda parte começou praticamente com um susto dado pelo Roberto, ao não segurar um remate rasteiro, mas o jogador do Braga que surgiu para a recarga estava deslocado. A resposta do Benfica foi marcar, quando estavam decorridos cinco minutos. O Maxi entrou como quis pela direita, centrou para um bom e colocado cabeceamento do Cardozo levar a bola novamente ao poste, e depois o Jardel em esforço conseguiu fazer a recarga para a baliza vazia. Estava feito o mais difícil, mas a felicidade durou pouco, já que um par de minutos depois o Braga repôs a igualdade. Foi num lance aparentemente inofensivo, em que despejaram um livre de muito longe para a grande área, e quase à entrada desta o Vandinho, de uma forma que nem pareceu muito intencional (estava de costas para a baliza) acabou por desviá-la de cabeça para fora do alcance do Roberto. Honestamente, não me pareceu que o Braga tivesse feito o suficiente para justificar marcar um golo, mas foram felizes naquele momento e o Benfica tinha que ir novamente à procura da vantagem. E também não foi necessário esperarmos muito por um novo golo: sete minutos depois, a fechar o primeiro quarto de hora, já o Benfica estava em vantagem outra vez. Depois da infelicidade de ter acertado nos postes por duas vezes, e da desinspiração que tem mostrado nos últimos jogos, na marcação de um livre à sua medida (uns metros longe da área, descaído para a direita), o Cardozo teve um lampejo dos seus melhores momentos e marcou o livre mesmo 'à Cardozo', enviando a bola em arco para junto do ângulo superior, sem quaisquer hipóteses de defesa para o guarda-redes. Três golos no espaço de menos de dez minutos prometiam uma segunda parte bem animada, mas foram enganadores. A partir daí o Benfica foi perdendo fulgor, e durante a maior parte da segunda metade destes quarenta e cinco minutos assistimos a um jogo muito pouco interessante, em que as duas equipas pareceram estar minimamente satisfeitas com o resultado. Uma parecia acreditar que a vantagem era suficiente, e a outra que desvantagem era recuperável na segunda mão. O Benfica ainda fez entrar o Gaitán e o Jara, mas estes pouco vieram acrescentar ao jogo. O Gaitán mostrou mesmo a razão pela qual não terá jogado de início, pois aparentou estar mal fisicamente, muitas vezes parecendo mesmo mais cansado do que muitos dos colegas que jogavam desde início.
Gostei de ver o Aimar (viu um amarelo e está de fora do segundo jogo), que lutou até à exaustão e foi dos mais esclarecidos durante todo o jogo. O Maxi Pereira e o Javi García também estiveram em bom plano, tal como o Coentrão, mas isso não é surpresa. O Cardozo não esteve brilhante na primeira parte, mas acabou por estar nos lances mais perigosos do Benfica, tendo acertado nos ferros duas vezes, marcado um golo, e estado directamente ligado ao outro. O livre que marcou deve ter-lhe feito muito bem á confiança, já que subiu de produção e passou a ganhar lances de cabeça e a conseguir segurar a bola para a passar aos colegas. O que mais me preocupa é que a equipa não parece estar fisicamente bem, e nos últimos minutos dos jogos isso tem-se notado.
Conforme escrevi, o primeiro passo está dado, embora mas ainda tenhamos pela frente muito trabalho. Mas nesta caminhada europeia já saímos da primeira mão com este resultado frente a equipas que, honestamente, mostraram bem mais do que o Braga quando jogaram na Luz, e isso não nos impediu de seguirmos em frente. E, como não me canso de repetir, em Braga não haverá outra vez um Xistra ou um Sousa como interveniente. Se trabalharmos e dermos o nosso melhor para lutarmos pelo resultado que nos interessa, não deveremos correr os riscos habituais de vermos o nosso esforço traído por algum dos artistas que já conhecemos, podendo então concentrar-nos em contrariar apenas o futebol do nosso adversário.
Acredito no Benfica como acredito no ar que respiro. Não o consigo ver, mas conto sempre com ele para me alimentar os pulmões. Viver desta forma é fácil - não é difícil, como alguns dizem - porque é natural. Inspiro o ar e inspiro o Benfica na mesma medida, e ambos me sustentam esta franzina moldura humana. Não é um acto de fé, nem sequer é um esforço consciente de motivação: é, sinceramente, tão natural como colocar um pé à frente do outro para andar, abrir os olhos para ver ou, sim, inspirar e expirar - respirar. Independentemente de toda a conjuntura, dos problemas que houver (e há), do momento de forma, das críticas justas ou injustas, das lesões, das limitações físicas ou psicológicas, da perda de competições que se contava legitimamente vencer, dos adeptos inclementes e sem memória, da hesitação e receio de muitos, do azar que persegue e se esconde à espreita, da vida torta. Mesmo quando tudo aponta noutro sentido, acredito no Benfica. Assim como acredito que toda a conquista digna e honrada implica luta, sofrimento e dedicação, pelo que acredito – vivo com essa crença entranhada - que o Benfica, na luta com fervor, com esse sofrimento e dedicação, conquistará a vitória e nos conquistará a todos.
Não é, para mim, confesso-o, um grande esforço nem um assomo de sacrifício estar amanhã nas bancadas do meu estádio a acreditar no meu Benfica: é-me natural e não consigo conceber outro qualquer sítio onde preferisse estar. No fim, independentemente do que acontecer, enlaço com firmeza o meu cachecol vermelho na minha carcaça sofrida e uso-o com o orgulho de sempre.
Não entendo – e isto não é uma crítica, é uma assunção das minhas limitações – quem assim não vive o Benfica e quem opta por dividir numa altura que clama por união.
Onde está o nosso povo? O povo que interessa estará amanhã no Estádio da Luz e por esse país e mundo fora, equilibrado – sem medo do abismo - numa linha tão invisível quanto a minha crença. Sem assobios, sem recriminações, sem renegar camisolas bem suadas e sem voltar as costas quando os nossos mais precisam.
Força meu Benfica, e um abraço a todos.
Um bom amigo benfiquista, dos que sabem que há momentos para nos entrincheirarmos e outros para caminharmos juntos, enviou-me uma sms em que me perguntava onde é que está a vibração, a crença e o incentivo. Em suma, acabava a sms perguntando-me onde está o nosso (benfiquista) povo.
Estamos nas meias-finais de uma prova europeia. E o nosso povo está unido com o Benfica. Hoje, não sei onde está o nosso povo. Amanhã, sei que estaremos todos na Luz, e todos seremos o nosso povo e todos seremos Benfica. Acredito que o nosso povo amanhã dirá “presente”. Acredito que a nossa equipa, os nossos jogadores, o nosso povo, o Benfica dirá “presente”. Não posso acreditar em algo que não seja isto. Não sei se é um sentimento racional, nem sei ter sentimentos racionais. Sinto-o porque o sei, e sei-o porque o sinto.
Desta vez não foi dentro do túnel. Foi às claras, sem um apagão que escondesse, por exemplo, a selvajaria com que partiram uma das balizas do nosso Estádio. Foi às claras que Sapunaru e Fernando agrediram assistentes de recinto desportivo.
Sobre esta agressão, poucas são as vozes que se erguem indignadas. Poucas as que denunciam, poucas as que afirmam sem medos que os futebolistas do fcp são uma cambada de arruaceiros. Quanto à maioria dos jornalistas, comentadores e afins, o seu silêncio selectivo mostra com quanta hipocrisia se constrói a respectiva coluna vertebral.
Denunciemos nós, benfiquistas.
Vitória natural e esperada na final da Taça da Liga, frente a um Paços de Ferreira que valorizou essa vitória porque nunca desistiu, e num jogo com duas partes muito diferentes. O mais importante foi mesmo a conquista da terceira Taça da Liga consecutiva que, espero, possa devolver à nossa equipa alguma da confiança que parece andar algo arredada dos nossos jogadores.
O Benfica apresentou um onze onde apenas a titularidade do Moreira terá sido algo inesperada. De resto, e face aos impedimentos, poderia haver alguma dúvida sobre se o Peixoto jogaria de início ou não. Como não jogou, foi o Jara quem ocupou o lado esquerdo, cabendo ao Carlos Martins jogar na direita do meio campo. Desde o apito inicial que o Benfica quis justificar o seu natural favoritismo, e tomou conta do jogo. Com o Aimar a jogar um pouco mais recuado do que o habitual, aparecendo mais próximo do Javi, e com o Saviola a recuar também, o Benfica ocupava eficazmente os espaços e submetia os jogadores do Paços a uma forte pressão quando tinham a bola, remetendo o adversário ao seu próprio meio campo. Aproveitando o pendor ofensivo dos laterais do Paços, o Benfica conseguia explorar bem as faixas laterais, sendo só de lamentar o mau aproveitamento que depois tinha das várias ocasiões em que conseguia libertar alguém nas laterais e ganhar a linha - sendo de destacar nesse aspecto o Carlos Martins, que só nos primeiros minutos deve ter tido uma meia dúzia de ocasiões para centrar a bola à vontade, e fê-lo quase invariavelmente mal. O golo acabou por surgir pois com naturalidade, e relativamente cedo - pouco após o primeiro quarto de hora - depois de uma insistência do Fábio Coentrão na esquerda, concluída com um centro para a entrada da pequena área, onde surgiu o Jara à vontade a finalizar de cabeça. Com vantagem no marcador, o Benfica continuou a dominar o jogo com alguma facilidade, e parecia que esta final decorreria conforme o esperado.
Mas um pouco antes da meia hora parecemos abrandar um pouco, e o Paços conseguiu finalmente acercar-se da nossa área. E já deveríamos estar fartos de saber que sempre que facilitamos um pouco, ficamos ao alcance de qualquer imprevisto, como por exemplo da arte do Proença, que à meia hora de jogo, e para aí na segunda vez que até aí um jogador do Paços conseguiu entrar na nossa área com a bola controlada, decidiu, com um rigor enorme, assinalar penálti do Maxi - a propósito de penáltis, não sei se muitos terão reparado, mas para aí aos dez minutos de jogo um defesa do Paços, já com a bola longe, empurrou e derrubou ostensivamente o Saviola dentro da área, o que seria um penálti claro porque a bola ainda estava em jogo, mas como é óbvio e normal nenhum membro da equipa de arbitragem viu o lance. Felizmente para nós, o Moreira defendeu o penálti, e este lance pareceu despertar novamente a nossa equipa, que voltou a dominar o jogo, e acabou por chegar ao segundo golo a três minutos do intervalo. Depois de um livre do Carlos Martins, o Luisão tocou para o centro da área, onde surgiu o Javi com tempo para tudo, incluindo para falhar o primeiro remate e depois marcar à segunda, apesar dos esforços do Cardozo para estragar o lance. E mesmo sobre o intervalo, Proença ao seu melhor estilo, esquecendo-se do rigor com que tinha assinalado o penálti contra nós minutos antes, e fechando os olhos a um penálti claro sobre o Saviola, que foi ceifado por um defesa do Paços.
Com dois golos de vantagem e uma superioridade clara demonstrada durante a primeira parte, poucos esperariam algum sobressalto na conquista da terceira Taça da Liga. Mas esta equipa do Benfica, actualmente, está longe daquela equipa que, ainda há poucos meses atrás, nos encantou e estabeleceu um novo recorde de vitórias consecutivas. E está longe sobretudo, parece-me, no aspecto mental. É que fica-se com a sensação que à menor contrariedade a equipa treme e começa a duvidar de si própria. O que, por outro lado, deve dar bastante confiança a quem nos defronta. A contrariedade neste jogo foi um autogolo do Luisão, num lance perfeitamente controlado e sem qualquer perigo para a nossa baliza. A partir daí o jogo foi outro. O Paços passou a ter muito mais posse de bola e a jogar no nosso meio campo, enquanto que nós fomos quase inofensivos no ataque. É verdade que nunca fomos propriamente sufocados, mas quem quer que visse o jogo apostaria mais facilmente no golo do empate do que no golo da tranquilidade para o Benfica. Ao fim de uma hora de jogo veio mais uma vez (já lhes perdi a conta - eu não estou a brincar sempre que escrevo isto) a rábula das dificuldades físicas do Carlos Martins, forçando a entrada do Peixoto e a passagem do Jara para a direita. Parece-me estranho que, sendo o Jara dextro, pareça complicar muito mais o seu jogo quando passa para o lado direito. E quando faltavam pouco mais de vinte minutos para o final, o Benfica pareceu admitir claramente que a prioridade era conservar a vantagem mínima, fazendo entrar o Aírton para o lugar do Saviola: a substituição deu resultado, pois se o Benfica continuava a não insistir muito no ataque - ainda esboçou alguns contra-ataques que deveriam ter tido melhor finalização - a verdade é que o Paços também não voltou a conseguir pressionar tanto como vinha fazendo até então, e foi com alguma tranquilidade que se escoaram os minutos até ao apito final.
O melhor do Benfica foi o Moreira. Não foi propriamente massacrado durante todo o jogo, mas defendeu um penálti e correspondeu sempre de forma muito segura quando foi chamado, fazendo ainda uma defesa espectacular a um remate do Manuel José. Não merecia ter sido traído pelo Luisão. Bom jogo também o Fábio Coentrão, para não fugir à regra. Confiança e força de vontade nunca lhe faltam, e luta por cada bola até ao limite. Quanto ao pior, claramente o Cardozo. Aliás, a exemplo do que tem acontecido quase sempre nos últimos jogos do Benfica. Praticamente não ganha um lance a um adversário, não consegue segurar uma bola, não consegue fazer um passe em condições, anda a finalizar mal - normalmente quando tudo o resto falhava, nisto pelo menos ele acertava - e até atrapalha os colegas. E o que é pior, anda por ali tristonho, parecendo que conformado com uma qualquer má sorte que lhe pesa nas costas, em vez de lutar. Já disse várias vezes que gosto muito do Cardozo mas sinceramente, nos últimos tempos, quando ele joga tem sido quase como jogar com um jogador a menos.
Salvio e Gaitán fazem mesmo muita falta, mas temos é que contar com quem temos. E é com estes que teremos que ser fortes e já na próxima quinta-feira começar a conquistar um lugar em Dublin. Esperemos que a conquista desta taça tenha servido para motivar e dar confiança à nossa equipa para esse jogo tão importante. E se precisarem ainda de uma pequena motivação extra, é lembrarem-se que o árbitro não será português.
Nos últimos meses, Pinto da Costa, que tem o exclusivo nacional daquilo a chamam “fina ironia”, chamou ‘filho da puta’ a um jornalista, ‘palhaço’ a um dirigente do Benfica e, recentemente, referiu-se a um adepto do Benfica como alguém sobre o qual Victor Hugo escreveu “Os Miseráveis”. Tudo se lhe aceita, nada se lhe condena.
No entanto, uma inquietação deveria atormentar esse varão pio da fina ironia. Referir-se à obra “Os Miseráveis” deveria obrigá-lo a conhecer mais da obra do que apenas a leitura do título. Saberia o dito varão que Jean Valjean foi o miserável condenado, perseguido e atormentado durante toda a vida por ter roubado um pão para alimentar a família. De entre os que o perseguiram, destacava-se Javert, o implacável, obsessivo e patético inspector de polícia. O mesmo que usava e abusava do seu poder, para, em nome de uma moral muito própria e questionável, perseguir Valjean. E como não recordar Thénardier?! O corrupto dono de uma estalagem que se viria a associar a um bando de criminosos, terminando os dias como traficante de escravos. Uns em nome da justiça, outros em nome do bom nome que herdaram se arvoraram em baluartes da ordem, da moral e dos bons costumes. Todos eles se demonstraram verdadeiros miseráveis. Abusaram do poder, chantagearam, perseguiram e, pontual e despudoradamente, vitimizaram-se. De entre todos, o que pôde terminar a longa saga de Victor Hugo sem o epíteto de ‘miserável’ foi Jean Valjean. A miséria humana ultrapassa a miopia dos homens e, para quem leu mais do que o título da obra, é óbvio quem são os miseráveis a quem Victor Hugo se refere.
Ao varão lusitano e ilustre detentor do exclusivo da ‘fina ironia’ recomendo a leitura dos grandes escritores do Século XIX. Pode começar por Vitor Hugo e terminar no nosso Eça. O mesmo Eça que escreveu “Que Deus o proteja, e a polícia o não incomode!”.
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Artigo de opinião publicado também na edição de 22/04/2011 do jornal "O Benfica".
[Se alguém quiser manifestar-me a sua opinião, pode fazê-lo para este endereço: tertuliabenfiquista@gmail.com]
As velhas máximas do futebol existem por alguma razão: "quem joga para empatar, arrisca-se a perder"... Acho incompreensível que não se tenha percebido isso dentro do Benfica. Sim, não tínhamos o Salvio e o Gaitán, mas no ano passado jogámos sem o Coentrão, Di María, Aimar e com o Ramires a 50%, e vencemos!
E depois, há outra coisa: para se ganhar jogos contra aquele clube, por vezes não basta só o 'profissionalismo', é necessário também 'Benfiquismo'. Se não de coração, pelo menos perceber-se o que é o Benfica e os seus sócios e adeptos. E o que eles sentem depois de uma derrota como a de ontem. O post abaixo do Pedro F. Ferreira exemplifica bem o que é isso.
Não se pode desperdiçar uma vantagem de dois golos jogando em casa, ainda por cima mostrando medo do adversário. É inaceitável e incompreensível! Até poderíamos ter sido eliminados na mesma, mas ao menos que fosse por querermos ganhar o jogo. 'Aquilo' de ontem, não foi NADA. Ou melhor, até foi: uma humilhante vergonha...
Terminado o jogo, também me senti como o Carlos Martins e como o "Caxinas".
Por vezes, faltam-me as forças para ajudar os camaradas de benfiquismo a reerguerem-se. Por vezes, preciso que venha um senhor Shéu a reerguer-me. Hoje sinto que há que levar esta nau até ao final da época. Chegados lá, importa que se repense bem o que de muito errado se fez na preparação da mesma. Há erros que não podem ser repetidos. Há demasiados erros que não podem ser repetidos e cujas responsabilidades têm de ser devidamente apuradas.
Foi importante ver o senhor Shéu a ajudar quem sente o Benfica. Também me ajudou a reerguer.
Facto indesmentível: o Porto mereceu a vitória no jogo, porque foi a melhor equipa em campo. E o Benfica pode e deve queixar-se de si próprio por ter perdido o jogo. Quanto ao Porto ter conseguido precisamente o resultado de que necessitava para vencer a eliminatória, para isso já contribuiu um factor estranho e habitual nos últimos anos, na pessoa de um dos suspeitos do costume.
Quanto à parte que diz respeito ao Benfica, é óbvio que só pode haver culpa própria de uma equipa que tem um jogo perfeitamente controlado durante uma hora e uma vantagem de dois golos na eliminatória, porque não pode perder o controlo de tal forma que em dez minutos conceda três golos ao adversário sem praticamente esboçar reacção. Porque até ao fatídico período desses dez minutos, nada fazia prever o desfecho que o jogo teve. O equilíbrio foi sempre uma constante durante toda a primeira parte, com as duas equipas a encaixarem bem uma na outra e muito pouco espaço para se jogar, sobretudo no meio campo. Que me lembre, apenas uma oportunidade para cada lado, a do Benfica num cabeceamento do Jardel, completamente solto após a marcação de um canto, que falhou o alvo, e a do Porto depois de um erro do mesmo Jardel, a escorregar e a deixar a bola nos pés do Úlque para um contra-ataque perigosíssimo que terminou com uma defesa impossível do Júlio César ao remate do Falcao. Na segunda parte, pouco parecia ter-se alterado de início, mas depois fiquei com a sensação de que o Benfica começou a perder o meio campo, primeiro com a entrada do James para o lugar do inconsequente Micael, e depois porque o Carlos Martins começou a ficar cansado e a deixar de conseguir acompanhar o Moutinho. Foi ele quem, à vontade, fez o primeiro golo, num bom remate de fora da área depois de uma recuperação de bola do Porto, para aí na décima perda de bola do Jara por não a querer passar a ninguém. E não consigo perceber o motivo pelo qual, continuando em vantagem na eliminatória, a equipa acusou tanto o golo. Honestamente, no estádio, e olhando para o campo, fiquei com a nítida sensação de que aquele primeiro golo fez os jogadores do Porto acreditar que podiam vencer a eliminatória, e por outro lado, fez os nossos ficarem convencidos que a perderiam. Não deixo o Jorge Jesus de fora das críticas: julgo que ele também percebeu que estávamos com um problema no meio campo, e preparava-se para fazer entrar o Aimar quando sofremos o primeiro golo. O golo, não sei porquê, fê-lo adiar a decisão, e quando o Aimar entrou, já perdíamos por três. A reacção final da equipa foi sobretudo em desespero de causa, e com tão pouco tempo para jogar, feita sem muita cabeça, pelo que poucas probabilidades tinha de dar algum resultado positivo.
Quanto ao 'factor X', o tal factor estranho, como de costume, basta fraquejarmos um pouco para que ele apareça. Não sei o que se terá passado ao intervalo, mas o Xistra pareceu voltar com a firme intenção de simplesmente não assinalar nada a favor do Benfica. Escrevo isto sem recurso a qualquer repetição, e com base apenas naquilo que vi no estádio, pelo que admito perfeitamente poder estar enganado, e isto ser também resultado da insatisfação pelo resultado. Não vou falar da tolerância que o Xistra mostrou sempre para os jogadores que já estavam amarelados e que continuavam a fazer faltas e a protestar a torto e a direito; vou falar apenas da cobardia que exibiu ao ver o Saviola ser agarrado quando se isolava - e viu-o perfeitamente, porque levou o apito à boca - e, quando se apercebeu que teria provavelmente que expulsar o infractor, resolveu não assinalar nada. No segundo golo do Porto, o Úlque está praticamente acampado junto à nossa baliza - responsabilidades sobretudo para o auxiliar, obviamente. E a jogada do terceiro golo começa no que me pareceu uma falta clara do Pereira sobre o Saviola quando saíamos para o ataque - foi mesmo à minha frente - mas ele continuava na fase em que não apitava nada a nosso favor. Depois do Porto ter a coisa encaminhada, assinalou um penálti a nosso favor que, sinceramente, me pareceu duvidoso.
Mas volto a dizer: a responsabilidade principal da derrota é do Benfica (e do mérito do Porto). O Xistra simplesmente ajudou a empurrar ainda mais para baixo. O Benfica não pode acusar um golo daquela forma, desorganizar-se, e deitar fora uma vantagem de dois golos no espaço de dez minutos. Simplesmente, não é admissível. E teria sempre que haver uma intervenção imediata do banco ao aperceber-se do estado das coisas. Reagir quando o mal já estava feito de pouco serviu. Isto não é uma crónica de jogo habitual, porque não me sinto em condições de fazer uma crónica habitual e está a custar-me estar aqui a escrever, não apenas pelo que se passou no jogo, pelo que peço desculpa se esta análise não corresponder às expectativas. Não vou estar sequer a escolher melhores ou piores; houve jogadores que estiveram muito mal naquele período crítico, e julgo que terá sido evidente para todos quem foram. Podemos lamentar ausências de jogadores como o Salvio ou o Gaitán, ou até mesmo a lesão prolongada do Rúben, mas se nos faltam depois opções à altura, também não será simplesmente por acaso.
Esta competição era para ganhar. Não há volta a dar-lhe, e a obrigação de a ganhar era ainda maior depois do resultado da primeira mão. Sermos eliminados é o falhanço rotundo de um dos objectivos da época, tal como a revalidação do título e mesmo a Supertaça eram objectivos. Para mim não há 'salvações de época', há objectivos, e a Taça da Liga do próximo Sábado é um deles, tal como chegarmos a Dublin é outro. Temos que saber concentrar-nos para atingir os objectivos que nos restam. E analisar seriamente as causas para os que falhámos.
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